Saiba quem pode (e quem não pode) ser testemunha na Justiça do Trabalho!
Neste artigo, você vai entender os critérios legais para a oitiva de testemunhas, com base na CLT, no CPC e na jurisprudência. Descubra quem está impedido ou suspeito de depor, como o juiz avalia a credibilidade dos depoimentos e os riscos do falso testemunho.
Por Mirella Franchini
Introdução
A prova testemunhal desempenha papel central no processo do trabalho, sobretudo diante da informalidade que marca muitas relações laborais no Brasil e da frequente escassez de documentação comprobatória. Nesse sentido, os depoimentos pessoais e testemunhais tornam-se decisivos para a formação do convencimento do julgador.
Assim, este artigo tem por objetivo examinar quem pode ser admitido como testemunha na Justiça do Trabalho, à luz das normas legais vigentes e da interpretação consolidada dos tribunais superiores. Para tanto, analisa-se os critérios legais e jurisprudenciais aplicáveis à prova testemunhal, com especial atenção aos conceitos de capacidade, impedimento, suspeição e credibilidade.
A abordagem adota uma perspectiva prática, combinando pesquisa legislativa, doutrinária e jurisprudencial, sendo especialmente útil a operadores do direito e candidatos ao Exame da OAB.
Conceito de testemunha no processo do trabalho
A testemunha é conceituada pela doutrina processual como terceiro imparcial que possui conhecimento direto sobre os fatos controvertidos e que pode colaborar com a formação do convencimento do juízo. No âmbito trabalhista, o art. 820 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) dispõe que “(…) as testemunhas serão inquiridas pelo juiz ou presidente, podendo ser reinquiridas, por seu intermédio, a requerimento dos vogais, das partes, seus representantes ou advogados”.
O art. 829 da CLT, por sua vez, estabelece critérios para a admissibilidade da prova testemunhal, permitindo que a parte contradite a testemunha que for parente até o terceiro grau civil, amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes. A norma visa resguardar a imparcialidade do depoimento, possibilitando ao magistrado, diante da contradita, decidir se acolhe a impugnação e, em caso positivo, ouvir a pessoa apenas como informante, sem a obrigatoriedade do compromisso legal de dizer a verdade.
Desse modo, o referido dispositivo cumpre papel fundamental na preservação da confiabilidade da prova oral, reforçando os princípios do contraditório, da ampla defesa e da busca pela verdade real.
Importa destacar que a testemunha deve relatar exclusivamente os fatos que tenha presenciado diretamente, isto é, aqueles cujo conhecimento tenha sido adquirido por meio de seus próprios sentidos. Esse entendimento é corroborado pelo Código de Processo Civil de 2015, cuja aplicação subsidiária ao processo do trabalho é admitida nos termos do art. 769 da CLT. Nos moldes do art. 447 do CPC/2015, a testemunha deve ser pessoa capaz e detentora de conhecimento direto sobre os fatos objeto da controvérsia.
Requisitos para atuação como testemunha
Para que se admita um indivíduo como testemunha, exige-se:
- Capacidade civil, nos termos dos arts. 3º e 4º do Código Civil;
- Conhecimento direto dos fatos relevantes;
- Ausência de interesse jurídico no litígio; e,
- Ausência de impedimento ou suspeição legalmente previstos.
O ordenamento jurídico admite a oitiva de colegas de trabalho, ex-empregados, fornecedores, clientes e terceiros que tenham presenciado os fatos controvertidos, desde que preenchidos os requisitos acima. O vínculo com a empresa ou com a parte não gera, por si só, suspeição, conforme dispõe a Súmula 357 do TST.
Impedimentos e suspeições legais
O CPC/2015, em seu art. 447, estabelece distinção entre impedimentos e suspeições que podem afastar a validade do depoimento testemunhal.
Impedimentos (art. 447, § 2º, CPC/2015)
Assim, são considerados impedidos de depor:
I - o cônjuge, o companheiro, o ascendente e o descendente em qualquer grau e o colateral, até o terceiro grau, de alguma das partes, por consanguinidade ou afinidade, salvo se o exigir o interesse público ou, tratando-se de causa relativa ao estado da pessoa, não se puder obter de outro modo a prova que o juiz repute necessária ao julgamento do mérito;
II - o que é parte na causa;
III - o que intervém em nome de uma parte, como o tutor, o representante legal da pessoa jurídica, o juiz, o advogado e outros que assistam ou tenham assistido as partes.
O impedimento tem caráter objetivo e gera a exclusão automática da testemunha.
Suspeições (art. 447, § 3º, CPC/2015)
São suspeitos:
I – o inimigo da parte ou o seu amigo íntimo;
II – o que tiver interesse no litígio.
A suspeição é de avaliação subjetiva, permitindo ao juiz ouvir o depoente e atribuir-lhe valor relativo, conforme art. 829 da CLT. A testemunha suspeita pode, inclusive, ser descompromissada e ouvida apenas como informante do juízo.
Credibilidade e avaliação judicial
A credibilidade da testemunha é aferida pelo juízo com base na coerência, firmeza, espontaneidade e compatibilidade de seu relato com os demais elementos constantes dos autos. A jurisprudência trabalhista tem reiterado que o vínculo empregatício com uma das partes não gera, por si só, a suspeição da testemunha, uma vez que tal situação não se enquadra nos impedimentos ou suspeições legais previstos nos arts. 829 da CLT e 447 do CPC/2015.
O Colendo Tribunal Superior do Trabalho tem firmado entendimento no sentido de que somente a ocupação de cargo de confiança, com ampla fidúcia e atuação direta como longa manus do empregador, pode configurar suspeição, diante da presunção de interesse no desfecho do litígio, nos termos do art. 447, § 3º, II, do CPC/2015.
Dever de comparecimento e veracidade
Nos termos do art. 825 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), as testemunhas comparecerão à audiência independentemente de notificação ou intimação. Contudo, conforme dispõe o parágrafo único do referido artigo, a testemunha que não comparecer poderá ser intimada, de ofício ou a requerimento da parte interessada.
Uma vez regularmente intimada, a testemunha tem o dever legal de comparecer e prestar depoimento, salvo nas hipóteses legalmente justificadas de recusa, como o exercício de sigilo profissional ou o risco de autoincriminação, nos termos do art. 448 do CPC/2015. O não comparecimento injustificado poderá ensejar a condução coercitiva, conforme previsto no art. 825, parágrafo único, da CLT, combinado com o art. 455, §5º, do CPC/2015.
Ademais, nos termos do art. 828 da CLT, toda testemunha será previamente qualificada antes de prestar o compromisso legal, ficando sujeita, em caso de falsidade, às sanções previstas na legislação penal. Além disso, a prestação de falso testemunho configura crime tipificado no art. 342 do Código Penal, com pena de reclusão de até quatro anos e multa.
Limitação do número de testemunhas
Nos termos do art. 821 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), cada parte poderá indicar até três testemunhas para a fase de instrução. Exceções a essa regra ocorrem no procedimento sumaríssimo, previsto no art. 852-H, §1º, da CLT, aplicável às causas cujo valor não ultrapasse 40 salários-mínimos, em que é admitida a oitiva de até duas testemunhas por parte, independentemente de intimação; e nos inquéritos judiciais para apuração de falta grave, previsto no art. 853 da CLT, nos quais, é permitida a oitiva de até seis testemunhas para cada parte.
Em todos os casos, o juiz poderá limitar ou ampliar esse número, desde que de forma fundamentada, observando os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Considerações finais
Por fim, a adequada escolha da prova testemunhal, observando-se os critérios legais e as estratégias processuais, é fundamental para a condução exitosa do processo trabalhista.
Conhecer os fundamentos legais sobre impedimento, suspeição, contradita e valoração da prova é indispensável tanto para a atuação profissional quanto para o desempenho em exames práticos, como a segunda fase da OAB.
Professora Mirella Franchini
Referências
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2023
BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.
BRASIL. Código de Processo Civil. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015.
BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940.
TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Súmula nº 357.
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