Olá, futuro Advogado(a), tudo certo?!
Em 19/11/2023, foi aplicada a prova da primeira fase do XXXIX Exame da Ordem dos Advogados do Brasil. Assim que encerrada, nosso time de professores elaborou o gabarito extraoficial e analisou o gabarito oficial da FGV, os quais serão apresentados juntamente com a nossa PROVA COMENTADA.
Este material visa a auxiliá-los na aferição das notas, elaboração de eventuais recursos, verificação das chances de avanço para fase discursiva, bem como na revisão do conteúdo cobrado no certame.
Desde já, destacamos que nosso time de professores identificou 3 questões passíveis de recurso e/ou anulação, por apresentarem duas ou nenhuma alternativa inteiramente correta, como veremos adiante. No tipo de prova comentado, trata-se das questões 17, 44, 46.
De modo complementar, elaboramos também um caderno para nossos seguidores, alunos ou não, observarem os comentários, e comentarem as questões da prova: Confira AQUI
Por fim, vocês poderão acompanhar os eventos e cursos para a fase discursiva, bem como outras novidades envolvendo o Exame de Ordem no nosso canal do Youtube. Inscreva-se e ative as notificações! Estratégia OAB – YouTube
Para conferir a prova comentada de todas a disciplinas, basta clicar no link abaixo.
Gabarito Extraoficial OAB XXXIX (39º) Exame
Prova comentada ECA
QUESTÃO 43. Eduardo adotou Bernardo, criança de dois anos, regularmente e de forma unilateral, tornando-se seu pai. Quando Bernardo completou três anos, Eduardo, infelizmente, faleceu vítima de um infarto. Eduardo não deixou parentes conhecidos.
Maria, a mãe biológica de Bernardo, sempre se arrependeu de tê-lo enviado à adoção. Sabendo do ocorrido e ciente de que não há o restabelecimento do vínculo do poder familiar, pelo fato de ter ocorrido a morte do adotante, Maria o procura, como advogado(a), para buscar uma solução que permita que Bernardo volte a ser seu filho.
Assinale a opção que apresenta a solução proposta.
a) A mãe biológica, infelizmente, não tem ao seu alcance qualquer medida para restabelecer o vínculo de parentalidade com Bernardo.
b) A mãe biológica deverá se candidatar à adoção de Bernardo, da mesma forma e pelos mesmos procedimentos que qualquer outro candidato.
c)A mãe biológica não poderá se candidatar à readoção de seu filho biológico, pois a dissolução do vínculo familiar é perene.
d) A inexistência de parentes do adotante falecido causa a excepcional restauração do vínculo familiar com a mãe biológica, fugindo à regra geral.
Comentários
A alternativa correta é a letra B.
A adoção é medida excepcional e irrevogável que rompe, definitivamente, os vínculos jurídicos com a família anterior. E, conforme art. 49 do ECA: “A morte dos adotantes não restabelece o poder familiar dos pais naturais.” Sendo assim, a mãe biológica deverá se candidatar à adoção de Bernardo, da mesma forma e pelos mesmos procedimentos que qualquer outro candidato.
Nesse sentido, as alternativas A, C, D estão incorretas.
QUESTÃO 44. Carlos e Joana, pais da criança Paula, estão dissolvendo sua união estável, ainda sem judicialização, detendo Joana a guarda de fato de Paula enquanto não regularizados os regimes de visitação ou compartilhamento de guarda.
Por razões profissionais, Carlos mudou-se para o município contíguo ao da residência de Joana e Paula. Ocorre que Carlos, estando insatisfeito com algumas decisões de Joana sobre a vida da criança, e não mais conseguindo ajustar amistosamente tais questões, precipitou o ajuizamento de processo para regulamentação da guarda e pensionamento, no Juízo da comarca que está residindo.
Joana procura você, como advogado(a), para representá-la, reclamando ter que se defender em outra cidade.
Com base no enunciado acima, sobre a questão da competência, assinale a orientação que você, corretamente, daria à Joana.
a) O juízo da residência de Carlos é tão competente quanto ao da residência de Joana, eis que apenas quando da definição da guarda – que é o que está pretendendo – a competência passa a ser do foro do guardião judicialmente definido.
b) A competência para este processo de regulação de guarda e pensão incube ao Juízo da comarca de residência de Paula, e não de Carlos, pois a guarda de fato já basta para tal fixação.
c)A competência será sempre definida em razão daquele que primeiro postular judicialmente a regulação da guarda.
d) A guarda é irrelevante para fins de determinação da competência, devendo ser processado o feito em razão do melhor interesse da criança, seja qual for o foro inicialmente escolhido.
Comentários
Trata-se de questão referente a conflito de competência em ação de regulamentação da guarda e pensionamento.
O Superior Tribunal de Justiça reconheceu como foro competente para julgar ação de guarda é o que melhor atenda ao interesse da criança.
De acordo com o Tribunal, a melhor solução para os conflitos de competência suscitados nos processos que envolvem menores não é verificar qual o juízo a quem primeiro foi distribuída a demanda ou que deferiu a guarda provisória antes, mas sim detectar aquele que, de acordo com os fatos delineados nos autos, melhor atende ao princípio da prioridade absoluta dos interesses da criança ou do adolescente.
O entendimento é da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e foi firmado em conflito de competência suscitado nos autos de ação para regularização de guarda de duas crianças.
Assim, de acordo com a jurisprudência do STJ:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO INTERNO NO CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÕES DE GUARDA. CUSTÓDIA DEFERIDA A AMBOS OS GENITORES EM AÇÕES DISTINTAS. SÚMULA 383/STJ. PREVALÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DO JUÍZO IMEDIATO E DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. Nos termos da Súmula 383/STJ: “A competência para processar e julgar as ações conexas de interesse de menor é, em princípio, do foro do domicílio do detentor de sua guarda.”
2. Na hipótese, os pais disputam a guarda do filho menor impúbere em duas ações contrapostas, nas quais ambos obtiveram a guarda judicial provisória, caracterizando-se o conflito positivo de competência entre os juízos paulista e potiguar.
3. Conflito resolvido levando-se em consideração as circunstâncias do caso, o enunciado da Súmula 383/STJ, bem como o princípio do juízo imediato, previsto no art. 147, I e II, do ECA, atrelado ao princípio do melhor interesse da criança, declarando que a competência para processar e julgar as ações conexas de interesse do menor deve ser fixada no foro do domicílio do detentor presente da guarda, ou seja, o da mãe, detentora atual da guarda efetiva, já que ambos os genitores possuem a guarda judicial provisória da criança.
4. Embargos de declaração julgados como agravo interno desprovido. EDcl no CC 171371 / SP
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA
2020/0072446-4. Rel.Min. RAUL ARAÚJO, julgado em 12/08/2020.
Tal jurisprudência apresenta conflito positivo de competência uma vez que ambos os genitores obtiveram a guarda provisória, situação distinta da apresentada pela questão, onde ainda não há a regulação da guarda. O que se pode extrair, no entanto, é a preponderância assumida pelo princípio do melhor interesse da criança em contraposição à aplicação normativa do ECA, o que também deve preponderar na questão apresentada no Exame de Ordem.
PROCESSO CIVIL. REGRAS PROCESSUAIS. GERAIS E ESPECIAIS. DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. COMPETÊNCIA. ADOÇÃO E GUARDA. PRINCÍPIOS DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO JUÍZO IMEDIATO.
1. A determinação da competência, em casos de disputa judicial sobre a guarda – ou mesmo a adoção – de infante deve garantir primazia ao melhor interesse da criança, mesmo que isso implique em flexibilização de outras normas.
2. O princípio do juízo imediato estabelece que a competência para apreciar e julgar medidas, ações e procedimentos que tutelam interesses, direitos e garantias positivados no ECA é determinada pelo lugar onde a criança ou o adolescente exerce, com regularidade, seu direito à convivência familiar e comunitária.
3. Embora seja compreendido como regra de competência territorial, o art. 147, I e II, do ECA apresenta natureza de competência absoluta.
Isso porque a necessidade de assegurar ao infante a convivência familiar e comunitária, bem como de lhe ofertar a prestação jurisdicional de forma prioritária, conferem caráter imperativo à determinação da competência.
4. O princípio do juízo imediato, previsto no art. 147, I e II, do ECA, desde que firmemente atrelado ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, sobrepõe-se às regras gerais de competência do CPC.
5. A regra da perpetuatio jurisdictionis, estabelecida no art. 87 do CPC, cede lugar à solução que oferece tutela jurisdicional mais ágil, eficaz e segura ao infante, permitindo, desse modo, a modificação da competência no curso do processo, sempre consideradas as peculiaridades da lide.
6. A aplicação do art. 87 do CPC, em contraposição ao art. 147, I e II, do ECA, somente é possível se – consideradas as especificidades de cada lide e sempre tendo como baliza o princípio do melhor interesse da criança – ocorrer mudança de domicílio da criança e de seus responsáveis depois de iniciada a ação e consequentemente configurada a relação processual.
7. Conflito negativo de competência conhecido para estabelecer como competente o Juízo suscitado. Rel.Min. NANCY ANDRIGHI, julgado em 08/09/2010.
A partir de tal julgado vê-se a superioridade da principiologia do Direito da Criança e do Adolescente perante o caso concreto, sobretudo no que se refere ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. Tal princípio é imperativo e prepondera em face da norma posta, de modo que os Tribunais deverão relativizar a interpretação normativa em benefício da criança e do adolescente.
Nas palavras de Válter Kenji Ishida (2015, p. 57), a doutrina da proteção integral e o princípio do melhor interesse são duas regras basilares do direito da infância e da juventude que devem permear todo tipo de interpretação dos casos envolvendo crianças e adolescentes. Trata-se da admissão da prioridade absoluta dos direitos da criança e adolescente. A Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989, em seu art. 1ªº e 3º, menciona que em todas as medidas concernentes às crianças terão consideração primordial os interesses superiores da criança.
Ademais, o autor aponta que já existiu polêmica sobre a fixação da competência, sobretudo pela discussão quanto a aplicação do art. 147, I e II do ECA, mas que é importante ressaltar que a regra do art. 147 do ECA pode não ser levada em conta, em face da regra do melhor interesse da criança ou adolescente.
Ademais, segundo Súmula do STJ, somente após a definição da guarda e quanto às ações conexas, é que a competência passa a ser do foro do domicílio do detentor de sua guarda, nos termos da Súmula 383 do STJ, in verbis:
Súmula n. 383 do STJ
A competência para processar e julgar as ações conexas de interesse de menor é, em princípio, do foro do domicílio do detentor de sua guarda. (SÚMULA 383, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/05/2009, DJe 08/06/2009).
Uma vez que a questão mencione que ainda não há definição da guarda, o domicílio do detentor de fato da guarda não deve ser tomado como fator preponderante frente ao princípio do melhor interesse da criança.
Sendo assim, de acordo com as assertivas da questão, tem-se:
A letra A está incorreta. A assertiva está incorreta pois não menciona o princípio do melhor interesse da criança para a solução quanto à regulação da guarda, mencionando apenas que ambos os juízos teriam competências equivalentes.
A letra B está incorreta. A assertiva está incorreta pois tal entendimento restou superado pela atual jurisprudência e doutrina, uma vez que a principiologia de proteção às crianças e adolescentes se sobrepõe às regras de definição de competência estabelecidas pelo art. 147, I e II do ECA.
A letra C está incorreta. A assertiva está incorreta pois traz regra sobre iniciativa de postulação que não se encontra presente no Estatuto da Criança e do Adolescente, tampouco junto ao Código de Processo Civil.
A letra D está correta. A assertiva está correta pois confirma a atual posição doutrinária de que o princípio do melhor interesse da criança deve preponderar sobre a aplicação pura da norma. Desse modo, as regras de competência poderão ser relativizadas pela autoridade judiciária quanto em face do cumprimento da principiologia do ECA.
Por tais fatos e fundamentos supracitados, requer-se a ALTERAÇÃO DE GABARITO PARA A LETRA “D”.
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